Sábado de manhã, saio para passear, como de costume.
Grata surpresa, procurando por uma vaga para deficientes constato que todas elas estão ocupadas. “Nossa,” penso, “então essa deve ser a hora em que todos saem para passear.”
Fico animada, finalmente poderei me orgulhar de meu país, de nossa civilidade, do respeito ao próximo, e de todo aquele blábláblá sobre inclusão social.
Depois de tanto procurar, encontro um lugar razoável para estacionar. Depois de todo o processo de tirar a cadeira do porta malas, montá-la, ajustá-la, encaixar os apoios dos pés, que nunca ficam iguais, estou finalmente pronta para a ultima leva de ajustes. Não pensem que durante esse processo alguém me ofereceu ajuda. Afinal, lembrem-se: não estou numa vaga própria para cadeirantes, o que significa que eu, meu marido e as duas enfermeiras que me acompanham estamos invadindo um pedaço da vaga ao lado. E é claro que nestas horas a lei que vale é a lei de Murphy, então há um carro esperando para entrar na bendita vaga ao meu lado.
É impressionante constatar o olhar de indiferença que certas pessoas conseguem fazer. Olho de rabo de olho, pois tenho certeza que nos próximos segundos alguém do carro vai olhar no relógio começando a demonstrar sinais de impaciência. Dito e feito! A expressão do olhar agora é outra, é algo como: bom agora já deu... E os dedos do motorista começam a tamborilar sobre o volante do carro. Imagino que a esposa nessa altura esteja dando palmadinhas na perna do marido dizendo: Calma, meu bem.
Então flagro um encontro de olhar entre os dois, como se consolando mutuamente.
Esquece o casal, com seus filhos já grandes no carro, que provavelmente causaram o mesmo transtorno para os demais no processo de retirada de um carrinho de bebê, juntamente com toda a parafernália necessária para um dia no shopping. Porém todo bebê é fofo, atraindo sorrisos simpáticos e olhares compreensivos. Finalmente acomodada em minha cadeira saio alegre do elevador, coração acelerado antecipando a satisfação de encontrar as pessoas que, como eu, não se escondem em casa esperando a vida passar.
Porém, corredor após corredor olhando por entre as pessoas e investigando no interior das lojas, não vejo sinal algum de cadeirantes, nem de pessoas com necessidades especiais. Mas penso: e as trinta vagas especiais, todas ocupadas... Por quem? Meu marido olha em duvida para mim e pergunta:
- O que você disse?
E eu respondo, entre assombrada e indignada:
- Não disse nada, estou só pensando alto...
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